Os recentes saltos da inteligência artificial elevaram expectativas sobre máquinas capazes de raciocinar como humanos, mas especialistas apontam que os sistemas atuais continuam limitados ao reconhecimento de padrões estatísticos e não atingem o ato de pensar no sentido filosófico.
Inteligência Artificial e os limites do raciocínio
Segundo o professor Ryan Leack, da USC Dornsife, os modelos de IA organizam frases, imagens ou comandos a partir de probabilidades calculadas em grandes bases de dados, sem compreender conceitos, intencionalidade ou contexto de forma autônoma.
Para ilustrar essa diferença, Leack retoma a famosa linha divisória de Platão, que classifica quatro níveis de compreensão: noesis, dianoia, pistis e eikasia, variando da apreensão intuitiva da verdade à simples imaginação.
A IA se localizaría, no máximo, na eikasia, porque muitas vezes produz textos verossímeis, mas suscetíveis a “alucinações”, isto é, informações fabricadas que soam plausíveis, porém imprecisas ou falsas.
Mesmo na dianoia, apoiada na argumentação lógica, os sistemas falham, pois não verificam coerência interna; eles apenas recombinam frases previamente vistas, sem consciência dos significados gerados.
O raciocínio humano ainda integra memória, sensação corporal, emoções e experiência vivida, fatores ausentes em softwares baseados em algoritmos e servidores distribuídos pela nuvem.
Inteligência Artificial, corpo e consciência
Platão relacionava a verdadeira inteligência à existência corpórea, argumento que ganha nova leitura quando se observam robôs humanoides, drones e veículos autônomos que carregam a IA para além das telas.
Ainda assim, ressalta Leack, esses artefatos utilizam sensores e atuadores, mas não dispõem de vivências subjetivas; operam por códigos que calculam rotações de motor ou trajetórias de voo sem experimentar dor, medo ou prazer.
O pesquisador observa que consciência envolve processos metabólicos contínuos, fragilidade biológica e interação constante com o meio ambiente, características não reproduzidas por circuitos eletrônicos.
Em diálogo hipotético com um chatbot, a pergunta “você consegue pensar?” recebe resposta padronizada: a ferramenta admite processar dados e gerar saídas coerentes, porém reconhece a ausência de consciência, emoções ou intenções.
Esse reconhecimento reforça a distinção entre simular pensamento e possuir pensamento, diferença que passa pelo simples “parecer” inteligente e o efetivo “ser” inteligente, debate que mobiliza filósofos desde a Antiguidade.
Para pesquisadores de IA, alcançar níveis de compreensão superiores exigiria novos paradigmas, possivelmente envolvendo hardware biomimético, aprendizagem contínua em ambientes físicos e integração de múltiplas formas de percepção.
Enquanto essas inovações não se materializam, empresas e laboratórios concentram esforços em expandir capacidade de cálculo, melhorar base de treinamento e refinar filtros que reduzam incoerências e alucinações.
Ainda que tais avanços ampliem aplicações em medicina, logística ou atendimento virtual, o consenso entre especialistas é que máquinas permanecem distantes de reproduzir noesis ou consciência plena.
Assim, a inteligência artificial atual fornece respostas rápidas, reconhece imagens, dirige veículos e até compõe textos, mas continua operando dentro de fronteiras definidas por estatística, sem atingir o patamar de um pensamento verdadeiramente humano.