GPS e a busca por autonomia
O governo federal instalou um grupo de trabalho para avaliar a viabilidade técnica, econômica e regulatória de um sistema brasileiro de posição, navegação e tempo, diante da hipótese de restrições norte-americanas ao GPS em território nacional.
A medida foi motivada por debates nas redes sociais após Washington anunciar tarifas de 50% sobre produtos brasileiros e ventilar novas sanções, entre elas o eventual bloqueio do serviço de navegação operado pelos Estados Unidos.
Embora não exista confirmação oficial sobre a intenção da Casa Branca, o Planalto decidiu preparar resposta preventiva e determinou a elaboração de relatório em 180 dias, prorrogáveis por intervalo idêntico.
O documento deverá mapear vulnerabilidades decorrentes da dependência de constelações estrangeiras, propor rotas tecnológicas e indicar incentivos para o desenvolvimento de um sistema nacional ou a adoção de alternativas já disponíveis.
Participam das discussões os ministérios da Ciência e Tecnologia, Defesa, Comunicações e Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, além de Anatel e Inpe, que fornecerão dados sobre capacidade industrial, laboratorial e de lançamento.
O escopo inclui estimar custos de implantação, prazos de maturação, número de satélites necessários e infraestrutura de controle em solo, bem como avaliar possíveis parcerias com universidades e empresas do setor espacial.
Entre as opções analisadas está o uso de constelações internacionais como o GLONASS, da Rússia, o BeiDou, da China, ou o Galileo, mantido pela União Europeia, sistemas já compatíveis com a maioria dos receptores modernos.
A alternativa regional também é considerada, contemplando o NavIC, desenvolvido pela Índia, ou o QZSS, operado pelo Japão, que oferecem cobertura estendida sobre partes do hemisfério sul.
Mesmo em caso de bloqueio unilateral do GPS, celulares, veículos e equipamentos profissionais continuariam aptos a captar sinais de satélites múltiplos, evitando perda total de serviço, segundo técnicos envolvidos no estudo.
O grupo examina ainda mecanismos de redundância, como integração entre navegação por satélite, inércia e radiofrequência terrestre, a fim de garantir continuidade em aplicações críticas.
O sistema de navegação mundial teve origem militar nos Estados Unidos no fim do século XX, destinado ao guiamento de mísseis, posicionamento de tropas e sincronização de operações estratégicas.
Na década de 1990, a tecnologia foi liberada para uso civil, tornando-se base para rotas aéreas, marítimas, rodoviárias, georreferenciamento agrícola, monitoramento ambiental e serviços de localização em tempo real.
Hoje a constelação GPS compreende dezenas de satélites distribuídos em seis planos orbitais, permitindo triangulação de sinais que determina posição com margem de erro de poucos metros.
No Brasil, o recurso está presente em celulares, veículos conectados, aeronaves, embarcações, tornozeleiras eletrônicas e sistemas de defesa civil, constituindo infraestrutura crítica para economia e segurança pública.
Segundo técnicos, a possível suspensão do serviço representaria impacto imediato em logística, telecomunicações e finanças, uma vez que transações bancárias dependem da marcação temporal gerada pelos satélites.
O relatório em elaboração considerará modelos de financiamento, incluindo cooperação internacional, incentivos fiscais a fornecedores nacionais e utilização de fundos de ciência, tecnologia e inovação.
Também serão avaliados requisitos para certificado de interoperabilidade, compatibilidade de espectro e normas de segurança cibernética que protejam sinais de interferência ou falsificação.
Concluída a etapa de diagnóstico, o governo definirá se opta por constelação própria, adesão a sistema existente ou modelo híbrido que combine satélites brasileiros com segmentos de parceiros estratégicos.
Autoridades envolvidas frisam que a iniciativa não significa rompimento com o GPS, mas busca reduzir riscos decorrentes de eventuais tensões políticas e ampliar a soberania tecnológica do país.
GPS: próximos passos do governo
As reuniões do grupo de trabalho ocorrerão no Palácio do Planalto e, após a entrega do relatório, caberá ao Conselho de Governo decidir sobre cronograma, orçamento e forma de execução do projeto.
Enquanto o estudo não é finalizado, técnicos reforçam a importância de manter dispositivos habilitados para múltiplas constelações, assegurando que setores estratégicos continuem operando mesmo diante de possíveis restrições externas.